Das remotas dunas de Agadir à contemporânea selva carioca
As novelas surgiram
praticamente junto com a TV no Brasil, mas só conquistaram audiência
significativa entre as décadas de 60 e 70, quando a Rede Globo começou a
investir nelas, não só como propaganda, mas como forma de entretenimento.
Anteriormente a isso, as novelas eram inspiradas nas soap operas norte americanas que eram propagandas destinadas às
donas de casa.
No início, as
novelas eram transmitidas apenas duas vezes por semana devido a falta de
interesse, e foi a partir de 1962 que elas passaram a ser transmitidas
diariamente, mas ainda eram “importadas”
de outros países da América do Sul. Os escritores brasileiros tinham
apenas o trabalho de fazer adaptações da obra para a realidade do país.
Foi com a chegada de
Glória Magadan na globo que isso mudou. Ela era escritora de radionovelas,
cubana, contratada da Colgate- Palmolive e Gessy Lever, e até então trabalhava
fazendo as novelas da TV Tupi.
As primeiras novelas
eram gravadas sempre em ambientes fechados, e era usada uma linguagem formal.
Foi em 1968, quando a TV Tupi transmitiu a novela Beto Rockefeller que isso mudou. A novela explorava ambientes
abertos e a sua linguagem era coloquial, descontraída. As novelas, a partir de
então, foram trazidas para o universo contemporâneo das cidades grandes
brasileiras.
Foi inspirado nessas
inovações trazidas pela TV Tupi que a Rede Globo produziu, em 1969, a novela Véu de Noiva. Nesse mesmo ano, a
emissora também fez a primeira transmissão do Jornal Nacional, programa esse
que garantiu recordes de audiência desde sua criação. O JN foi o primeiro
programa que tinha transmissão simultânea no Brasil inteiro, sendo que seu
sinal chegava nas partes mais remotas do país, onde ainda não existia a energia
elétrica.
A Rede Globo desde
sua primeira novela genuinamente brasileira firmou um compromisso de sempre se
inovar, sendo que a cada nova novela produzida, deveria haver uma novidade,
algo que não tinha em nenhuma das anteriores. Sempre tentando alcançar a
modernidade, as novelas faziam e fazem até hoje merchandising, não só de
caráter consumista, mas também divulgam trabalhos de ONGs, sendo esse o
merchandising social. Isso tudo pra mostrar “o Brasil que se moderniza”.
Além disso, as
novelas tem um certo caráter social que busca discutir assunto que estiverem em
voga na época da exibição. Elas, por exemplo, mostraram a evolução da mulher
diante à sociedade.
Juntando o caráter
das novelas, a discussão dos tabus, a modernização do Brasil e ainda tendo
espaço pra romance e, às vezes, humor, pode-se dizer que a Rede Globo tem a
receita perfeita de fazer novelas e, por isso, elas constituem o “principal
produto” da emissora, produto esse que influencia na vida dos telespectadores
de forma positiva ou não.
Esther Hamburger é professora
de Comunicação e Artes da USP e crítica de TV. Além de antropóloga, colunista
do Jornal Folha de São Paulo e editora da Revista Trópico.
“As pessoas
estão interessadas em crescer intelectualmente e vão prestigiar uma programação
que as desafie nesse sentido.”
“Acredito que
deveria haver uma disciplina obrigatória no currículo escolar que visasse algo
como uma ‘alfabetização audiovisual’ e que incluísse teoria e prática.”
No Brasil, os
televisores tiveram grande difusão. Em pouco tempo, a TV chegou a muitas
regiões do país, até nos lugares mais longínquos e precários, como na zona
rural e nas favelas. Com a grande disseminação da TV, vieram as oportunidades
de se eliminar obstáculos sociais e geográficos. As informações e o
entretenimento, por exemplo, passaram a chegar a domicílios de pessoas mais
pobres e excluídas socialmente. A TV deixou de ser restrita a um pequeno grupo
de indivíduos privilegiados: intelectuais, ricos, entre outros. Pessoas de
diferentes sexos, regiões, gerações e classes sociais começavam a poder se
posicionar e se situar uma em relação às outras.
Apesar dos
pontos positivos, a TV naquela época e hoje ainda apresenta aspectos negativos.
A super-representação de brancos em relação a negros transmitida em novelas ou
até mesmo em programas fomentou e ainda fomenta a discriminação racial.
Em 1950, Assis
Chateubriand (jornalista, empresário e político) inaugurou a extinta TV Tupi na
cidade de São Paulo. Posteriormente, foi criada as Emissoras Associadas com
filiais da Tupi em vários estados do país. Fato que ajudou a emissora a ganhar
mais popularidade ainda.
Nasciam na
mesma época outras emissoras. Em 1952 a TV Paulista, em 1953 a Record, em 1954
a TV Rio, em 1956 a TV Italacomi de Belo Horizonte.
Os símbolos
de algumas emissoras eram bem conhecidos e tinham todo um significado. O da tupi
era a figura de um índio com antes na cabeça. Representava quem está pronto
para receber informações, entrar numa nova era de comunicação, sem ter medo de
ser engolido pelas novidades. Já o da
Rede Globo remetia à globalização, à figura de quem está apto a receber e
transmitir imagens para o mundo todo.
Dentro da
programação das TVs, as telenovelas eram o que havia de mais popular, era
aquilo que o público mais tinha aceitação e identificação. Por conta disso, elas
tiveram e ainda têm muito poder influenciador. Seja para disseminar novas modas
e estilos, colocar em pauta assuntos polêmicos. O êxodo rural também foi
influenciado pelos folhetins, além da diminuição do número de filhos por
família, o aumento do mercado de consumo e mais. As novelas sempre estiveram
num plano futuro, exibindo e levando os telespectadores para aquilo que ainda
estava por vir.
Na novela
Vale Tudo transmitida em 1988 pela Rede Globo teve em uma de suas últimas
cenas, um empresário corrupto que fugia do país sem ser punido. Situação que se
repetiria por muitas vezes na vida real, dentro principalmente do nosso cenário
político.
Nos anos 80,
um acordo entre Embratel, Globo e Bandeirantes permitiu com que os sinais das
Tvs fossem captados por todo o Brasil, através de antenas parabólicas.
Consequentemente, houve o crescimento na indústria de parabólicas. O sucesso
das telenovelas era tanto que em 83 apenas 23% da programação era importada.
Na década de
90, entretanto, a disputa por audiência entre as TVs de canal aberto e o
nascimento da TV a cabo ocasionaram a queda de audiência das telenovelas.
Mais tarde,
elas voltaram a ter muito sucesso e grande audiência. Muitas das novelas foram
transmitidas em diversos países. Tanto que a Rede Globo passou a ser apontada
como ameaçadora da identidade cultural, da heterogeneidade dos povos. Grupo: Agnes Nunes, Bruna Diniz e Shirlley Lopes
É graduado em Ciências
Sociais (1982) e em Direito (1983) na Universidade de São Paulo, onde se
doutorou em Sociologia (1989). Defendeu tese de livre-docência na Universidade
Estadual de Campinas (1999), na qual é Professor Titular de Sociologia desde 2005.
Ingressou na UNICAMP em 1998, foi docente da Universidade Estadual Paulista
(UNESP), campus de Araraquara (1990-1998), e da Universidade Estadual de
Londrina (1983-1990). Atualmente, integra a Coordenação de Ciências Humanas e
Sociais na Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (FAPESP). Foi
Secretário Executivo da Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em
Ciências Sociais (ANPOCS, 2004-2008). Tem experiência na área de Sociologia,
atuando principalmente nos seguintes temas: cultura/ arte e politica/ esquerda
brasileira/ intelectualidade brasileira/ pensamento marxista/ ditadura militar
brasileira/ anos 1960. (Fonte: Currículo Lattes)
A década de 1960 talvez tenha sido a
época de maior convergência revolucionária entre política, cultura, vida
pública e privada. A rebeldia contra a ordem social vigente, e o desejo de uma
revolução social, eram diálogos constantes nesse período. É são nas
manifestações artísticas que esses “rebeldes” encontram uma, de diversas
formas, para se expressarem. Partidos e movimentos de esquerda, intelectuais e
artistas prezavam a ação para mudar a história e construir um novo homem. Esse
novo homem seria aquele do passado, o autêntico homem do povo, o verdadeiro
brasileiro. Vindo do interior do Brasil, ele não fora influenciado pala
urbanização capitalista. Esse era o ideal de sujeito que os movimentos
esquerdistas buscavam, a fim de construir uma nova nação. Exemplos desse homem
seriam o indígena, o negro e os camponeses.
O processo de questionar a ordem
social vigente no Brasil se enquadrou no “Romantismo Revolucionário
Brasileiro”. Colocava-se à prova o problema de identidade nacional e política
do povo brasileiro. Entre os traços em comum do romantismo brasileiro e o de
outras nações estão: liberação sexual, busca por renovação, desejo de viver o
momento, vida boêmia e a fusão entre vida pública e privada.
Antes do golpe de 1964, já existiam
expressivas manifestações artísticas no Brasil. Muitas deles, já contestadoras
da realidade. Uma delas foi o Teatro de
Arena. Formado em 1956 através da junção do Teatro Paulista dos Estudantes
(TPE) e, do então pequeno, Arena. Essa fusão gerou uma renovação da dramaturgia
nacional. O novo Teatro Arena não buscava influência nas vanguardas
estrangeiras, não queriam mais apenas importar peças de países ricos. Eles
buscavam identidade própria, baseado na cultura brasileira e no “novo homem”.
Era a nacionalização e popularização do teatro.
Além de referência cultural, o Teatro
de Arena acabou se tornando um pólo de atração político. Lá, jovens engajados
politicamente se encontravam para trocar ideias e discutir a realidade
brasileira. Após o golpe de 64, o Arena viria a se tornar um centro de
resistência cultural.
Outro centro importante de resistência
e manifestação cultura do pré-64 foi o “Centro
Popular de Cultura” (CPC). Ele foi criado no início dos anos 1960, da
junção de dissidentes do Teatro de Arenas
e a UNE (União Nacional dos Estudantes). Ele tinha o objetivo de fazer
uma arte popular em diversas áreas, como cinema, teatro, literatura, artes
plásticas e música. Graças ao projeto UNE Volante – comitiva de dirigentes que
iam aos principais centros universitários de todo o país, levando propostas
políticas aos estudantes – o CPC conquistou 12 filias por todo o Brasil.
Um projeto ligado ao CPC e que
representa claramente o “Romantismo Revolucionário Brasileiro” é a coletânea de
poemas “Violão de Rua – Poemas para a
liberdade”. Durante os três volumes, transparece a emoção dos poetas pelo
sofrimento do próximo e a denúncia das condições de vida subumanas na cidade e
no campo. O drama dos retirantes nordestinos e a reforma agrária são diversas
vezes citados. Os poetas recusavam as ações de latifundiários, imperialistas e
capitalistas. Nos poemas, podemos observar a idealização do homem do campo,
simples, pobre. Esse mesmo homem considerado “ideal” para os movimentos
esquerdistas.
A sétima arte também contribuiu com a
reflexão sobre a realidade brasileira. O Cinema Novo, composto por cineastas e
intelectuais como Glauber Rocha, talvez o maior expoente, fez deslanchar filmes
independentes e de baixo orçamento com o slogan, “Uma câmera na mão e uma ideia
na cabeça.”.
No conturbado período pós-golpe de
1964, os artistas usaram de seus espetáculos para fazerem protestos contra o
governo. Estudantes e canais de representação política começaram a se inserirem
em manifestações políticas a fim de lutarem em prol da liberdade.
Assim, a esquerda fortaleceu a
cultura, tendo como o primeiro marco, o show Opinião, unindo teatro e música
popular brasileira. O Opinião fez enorme sucesso, sendo representando por Zé
Kéti, Nara Leão e João do Vale.
Show Opinião
Marcelo Ridenti também destaca o
Teatro Oficina, originado por estudantes da USP, que ganhou força depois da
encenação da peça de Oswald de Andrade O
rei da vela, que expõe uma critica ao subdesenvolvimento e dependência externa
do Brasil, que vai de encontro com filme Terra em Transe de Glauber Rocha,
sendo seguida da peça de Chico Buarque Roda Viva, recriada por José Celso Martinez
Correa. Com o Rei da vela coloca-se a questão da identidade nacional, construindo
assim, o movimento chamado tropicalismo.
Roda Viva
A Tropicália, segundo Carlos Nelson
Coutinho, foi formada pelas ideias de Glauber Rocha. O movimento era formado
por artistas, principalmente da musica popular como Caetano Veloso, Gilberto
Gil, Tom Zé, Os mutantes entre outros de diversos campos da arte.
Rita lee (Os Mutantes) sobre o Tropicalismo:
A contracultura era um dos pilares que
influenciava o tropicalismo. Pregando mensagens como “paz e amor” e “faça amor,
não faça guerra”, muito usados pelos jovens americanos em manifestações contra
a Guerra do Vietnã.
O movimento hippie, com seu modo de
vida alternativo também influenciou o movimento brasileiro. Hélio Oiticica foi
o autor do termo Tropicália, um projeto ambiental que inspirou o movimento de
mesmo nome.
Segundo o militante tropicalista
Torquato Neto, o tropicalismo seria assumir tudo o que os trópicos podem dar,
sem preconceitos.
Para Caetano Veloso, a palavra-chave
do tropicalismo seria o sincretismo. O movimento juntava psicodelismo, moda, comportamentos
hippies e música pop. Também se influenciaram pelo cinema, pelos Beatles e
outros grupos de rock. As ideias antropofágicas dos modernistas “caíam como uma
luva nos pontos de vista dos tropicalistas”. A cultura nacional que se formou,
empenhava-se em constituir uma identidade nacional.
O autor insere trechos do livro de memórias
de Caetano Veloso, Verdade Tropical, no qual o tropicalista fala sobre os
anseios dos participantes do movimento, da “identificação poética” deles com a
esquerda e de seus exílio em Londres.
Em 1968 é decretado o Ato
Institucional nº 5 (AI-5), conhecido como o golpe dentro do golpe, endurecendo
mais ainda o regime. Vários estudantes, intelectuais, artistas e políticos
foram torturados, casados ou forçados ao exílio. A imprensa foi duramente
censurada assim como qualquer contestação ao governo. Surge o slogan, “Brasil, ame-o
ou deixe-o”.
A agitação cultural e política no
mundo durante a década de 60 ligava-se a uma série de fatores comuns em
diversas sociedades como a crescente urbanização, aumento da classe média,
maior acesso ao ensino superior (predominância de jovens na população),
conservadorismo político e o avanço tecnológico (que possibilitaram mudanças de
comportamento da população), levando-se em consideração as especificidades
locais, como a luta pelas reformas de base antes do golpe de 1964 no Brasil e a
luta armada em decorrência deste. Essas ligações por si só não determinam a
existência das diversas ações inovadoras nos campos referidos, mas mostram-se
como uma espécie de base para estas.
Essas ações tinham como princípio
norteador aproximar a política e cultura do dia-a-dia através do fortalecimento
da imaginação, dando origem a movimentos libertários (principalmente em 1968),
que continham no seu âmago características comuns como a ascensão da ética da
revolta e da revolução (desobediência civil), novas doutrinas revolucionárias,
negação da sociedade de consumo (guerras imperialistas), crise no sistema
educacional e político (conservador) e principalmente a ânsia por liberdade
pessoal e coletiva responsável pelo surgimento de diversos movimentos pelos
direitos civis.
Assim ao analisarmos estes movimentos
é possível encontrarmos, principalmente no cenário brasileiro onde a
industrialização era recente e a classe dominante ainda era profundamente
arcaica e aristocrática, certa evolução dos ideais modernistas no início do
século passado.
Após a derrota das esquerdas
brasileiras e as mudanças políticas internacionais durante a década de 70,
ideais como o da proximidade de uma revolução social e a utilização de novas
tecnologias como forma de libertação dissiparam-se levando consigo o ensaio
geral de socialização da cultura e as demais ações ligadas a esta. Tendo o
governo ditatorial (após uma série de movimentos repressores) criado órgãos e
instituições (Ministério das Comunicações, Embratel, Embrafilme, Conselho
Federal de Cultura entre outras.) e unindo-se a iniciativa privada, florescendo
assim uma indústria cultural pautada principalmente no setor televisivo (Rede
Globo), fonográfico, editorial e de propaganda visando à incorporação dos
intelectuais oposicionistas e o ambiente cultural dominado pela esquerda, algo
que se mostra efetivo até a abertura político-econômica no final dos anos 80.
Isto ocorreu devido há uma série de concessões em relação à liberdade de
criação e de mudanças na conduta destes intelectuais, considerando que neste
momento históricos estes buscavam mais o apelo individual do que o social,
adotando a mercantilização da cultura em detrimento aos objetivos dos
movimentos contestadores da década anterior.
O ensino superior fortalece-se
enquanto o 1º e 2º grau públicos transformam-se em obsoletos. A pós-graduação é
incentivada desde que os seus beneficiários não se opusessem ao Estado,
procurando viver em função do ambiente acadêmico. Os pedidos de modernização de
certa forma são atendidos e conceitos como o da revolução sexual enraízam-se no
sistema, adquirindo novos significados.
Com a Lei da Anistia (1979) e o
Pluripartidarismo (1980) entre outras medidas que decretavam o fim do regime,
ficou evidente a necessidade de reformulação da esquerda em relação ao valor da
democracia, do individualismo, dos direitos civis (incluindo as minorias) e
principalmente do conceito de cidadania.
Movimentos contestadores e o
surgimento do Partido dos Trabalhadores (PT) (fundamentado no novo
sindicalismo, nas Comunidades Eclesiais da Igreja Católica e de intelectuais e
militantes dos antigos movimentos de esquerda), aliado a degradação do regime
comunista soviético norteiam esse período de transição na história brasileira.
O auto-sacrifício em prol da revolução
e do partido, perdeu força em detrimento da individualidade, criando-se novas
alternativas. O antigo modelo de intelectual ou artista rebelde torna-se
ultrapassado, os dilemas sobre privilégios de uns e a falta destes para outros,
presentes no sistema capitalista são vistos como imutáveis (dogmas se
estabelecem nas universidades, teoria e prática não se misturam, cultura e
política se afastam do cidadão).
A institucionalização dos
intelectuais e seus danos é visível, sendo que este termo ganha o significado
de profissão. A arte contestadora torna-se artigo de luxo nas galerias, anseios
por consumo surgem nas diversas classes da sociedade e o conservadorismo
modifica-se ganhando fôlego novo.
Após o “Consenso de Washington” e o
surgimento de uma Nova Ordem Mundial liderada pelo Estados Unidos, as antigas
alternativas de contestação ficam pouco usuais e pequenos focos de resistência
tentam manter vivos como o movimento Arte contra a Barbárie (1999) e diversos
fóruns que visam usar a arte e outros meios para educar a sociedade divergindo
da hegemonia cultura do pensamento neoliberal vigente. Mantendo vivo o desejo
de diminuir a influência da cultura de massa, que contribui para a manutenção
do sistema.
GRUPO (EM ORDEM ALFABÉTICA): ANDERSON CAMARGO, CHRISTIAN SILVANO E MARCO ANTONIO BARROS.
“CRISE
DA DITADURA MILITAR E O PROCESSO DE ABERTURA POLÍTICA NO BRASIL,
1974-1985”,
de Francisco Carlos Teixeira da Silva
Professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e especialista em história moderna e contemporânea, Francisco escreve um capítulo do livro "O tempo da ditadura - regime militar e movimentos sociais do século XX" cuja coletânea se chama "O Brasil Republicano", organizado por Jorge Ferreira e Lucilia de Almeida Neves Delgado.
Os
autores dos capítulos são historiadores que atuam em universidades
e instituições de pesquisa de diferentes estados. Foram
convidados levando-se em conta os critérios de pluralidade,
especialidade e reconhecimento acadêmico. Sob
o prisma da história política, social, cultural e econômica, eles
sugerem hipóteses interpretativas que visam a contribuir com o
esforço reflexivo sobre as peculiaridades da história do Brasil
República, destacando a atuação dos sujeitos históricos que a
construíram. Ex-militante
comunista, hoje trabalha junto ao Exército, levando o debate
histórico para escolas militares. Ele retira das Forças Armadas a
responsabilidade exclusiva pelo golpe de 1964. Por outro lado, não
entende a resistência de alguns oficiais ao julgamento de
torturadores.
Inicia a sua análise situando o contexto histórico das ditaduras militares na América do Sul, que surgiram por volta dos 60 e 70 e entraram em crise nos anos 80. Para Francisco, o entendimento do processo que levou os regimes do apogeu à bancarrota precisa ir além dos processos de crise, atores e condicionantes principais. O entendimento da "natureza" desses regimes é fundamental. A perestroika (reforma econômica)e a glasnost (reforma política) de Mikhail Gorbachev na URSS, ascensão de Jimmy Carter à presidência dos EUA em 1976 e a economia mundial são citados como atores e condicionantes externos. Entre os internos (referindo-se ao Brasil), Francisco cita o Projeto Golbery-Geisel e a expressiva vitória eleitoral do MDB (único partido de oposição com atuação autônoma, porém condicionada) em 1974. Para o autor, o contexto da Guerra Fria influenciou os EUA a incentivarem - até mesmo financeiramente - golpes que trariam a "estabilidade política" aos "países inclinados à esquerda". O apoio do empresariado e de setores religiosos - basta lembrar que o socialismo prega o ateísmo - também apoiaram os regimes em busca de "estabilidade". Tratando mais especificadamente dos atores externos, a mudança de postura dos Estados Unidos quanto à sua política exterior foi tratada com grande importância. Francisco caracteriza Richard Nixon-Henry Kissinger como "fomentadores de golpes". Em 1976, Jimmy Carter assume a presidência e busca recuperar a credibilidade americana através de uma mudança na política externa após o fracasso na Guerra do Vietnã (1955-75). A defesa de valores éticos e morais, bem como de governos democráticos foi um dos pontos agora "abraçados" por Carter. A recuperação de credibilidade começaria pela própria imagem do presidente, abalada após o escândalo de Watergate (1973). O presidente deveria ser capaz de transmitir simpatia e confiança. Ernesto Geisel (1906-1996) adotou uma postura nacionalista militar, com "a intenção de defender a soberania nacional". Posturas de Geisel como o reconhecimento da China Popular, Angola e Moçambique e a condenação de Israel na ONU podem ser interpretadas como uma afronta aos interesses norte-americanos. A influência dos EUA, porém, não pode ser considerada, sozinha, a única responsável pela conjuntura externa que enfraqueceu os regimes. Um período de crise e recessão da economia mundial, a alta assustadora do petróleo no período pós-Guerra do Yon Kippur (1973) e Irã-Iraque (1980-88) e a crise dos juros externos (1982) são outros fatores citados por Francisco. O autor segue listando os principais conflitos internos que teriam possibilitado a abertura. Tanto as cisões ideológicas presentes no meio dos militares - com castelistas e liberalistas discutindo com frequência no âmbito político - quanto as dificuldades enfrentadas pela economia construída pelo regime. A pressão de setores da sociedade civil também é levada em conta. Após o sequestro do embaixador norte-americano, em 1969 se observa uma resposta rígida do governo: aprovação da Lei de Segurança Nacional (pena de morte e o banimento de dissidentes políticos), criação dos DOI-Codis (responsável pela investigação e espionagem principalmente dos grupos revolucionários) e o aumento das operações da Polícia Militar. O
primeiro ato de enfrentamento entre o projeto oficial de abertura e a
oposição, foi a sucessão do presidente Médici (1969-1974). O
escolhido para a sucessão foi Ernesto Geisel, um general com
experiência vasta na política. Dentro
do plano militar Ernesto Geisel e o general Golbery do Couto e Silva
deveriam organizar a constitucionalização do país, tendo como meta
uma distensão lenta, gradual e segura. Esse projeto de abertura
comportava garantias básicas para o regime: impedir a volta de
pessoas para instituições anteriores; Incorporação de uma nova
constituição e prolongar-se por pelo menos dez anos garantindo a
sucessão de Geisel. Esse era o plano Geisel e Golbery.
No
Brasil os militares liberalizantes não foram apoiados pela oposição
como ocorreu em alguns países, pois para os oposicionistas o projeto
de abertura seria muito lento da maneira planejada. Para os
organizadores da abertura foi melhor que a oposição não
colaborasse, pois com esse pensamento eles seriam um estorvo para os
planos. Nas
eleições de Geisel o MDB (Movimento Democrático Brasileiro), em um
primeiro ato de oposição lançou a candidatura de Ulisses Guimarães
e Barbosa Lima Sobrinho. Geisel venceu as eleições.
Porém nas
eleições parlamentares disputadas em 1974 o MDB sai vencedor,
elegendo 16 senadores e 187 deputados. Para o presidente do MDB esse
foi o primeiro sinal de que o povo estava insatisfeito com o regime.
Com a vitória da oposição o projeto de abertura fica abalado e
nesse contexto aumentam os casos de violência. Alguns membros do
poder militar diziam que o projeto de abertura estava sob controle e
sendo monitorado todo tempo, mesmo perante todos os acontecimentos.
A
violência e as mortes ocorridas nesta época revoltaram a população
e fez com que uma parcela ainda maior da sociedade se tornasse contra
o regime militar. Geisel intervém nesse problema rapidamente e com a
intenção de acalmar os ânimos e punir alguém pelas mortes, o
general demite o comandante Ednardo d’Ávila Melo, mas não busca
os verdadeiros culpados. Em
meados de 1976 a oposição começa os ataques à bomba no Rio de
Janeiro.
A população estava descontente com a lentidão da abertura
e com a crise do petróleo, que após ser ignorada por quase dois
anos começava a mostrar seus efeitos negativos. Nesse momento Geisel
incumbe o ministro do planejamento, Reis Velloso, de organizar o II
Plano Nacional de Desenvolvimento (PND), plano que construiria
hidrelétricas como uma fonte alternativa de energia, faria um acordo
nuclear com a Alemanha, e daria ênfase ao Proálcool.
Agora
com as vitórias, a oposição quer mais espaço e é quando aparece
novamente a figura de Ulisses Guimarães, como a voz que enfrentava o
poder em nome do MDB. Com o projeto de abertura cada vez mais ameaçado e a crise
financeira e econômica avolumando-se, chega a hora de escolher um
sucessor de Geisel e o indicado é João Baptista Figueiredo, este
toma posse em 1979.
O principal ponto da agenda de Figueiredo era a
anistia. Depois que esse ponto foi solucionado, surgiu às lideranças
sindicais, pois Figueiredo assumiu o governo em uma época de crise
financeira, greves e reivindicações por melhores salários. Ainda neste cenário é que acontecem novos ataques à bomba e o mais
grave ato terrorista do Brasil, o Riocentro. Perante a tudo isso
Figueiredo nada fazia, assim criou-se um conflito interno no governo,
o general Golbery foi demitido e desse modo o plano Geisel e Golbery
ficava órfão.
Já em fase final o povo saia às ruas, primeiro pela anistia e
agora pelas eleições diretas com o apoio do PT. O país fica
marcado pela sua inépcia na economia e pela impunidade dos que
matam. Com a imobilidade de Figueiredo os partidos políticos assumem
a frente da abertura. Em fase de novas eleições aparecem Paulo Maluf, José Sarney e
Tancredo Neves. E em 1985 a chapa formada por Tancredo e Sarney, após
algumas mudanças partidárias, é a vencedora. Tem inicio a Nova
República.